Crítica: “A Menina e o Leão”

São incontáveis as frases de autores conhecidos ou anônimos que afirmam o valor de uma amizade em nossas vidas. Tesouros, milagres, bênçãos, há muitas qualificações para tentar explicar o que representa a presença de um amigo de verdade em nossas vidas.

Mesmo que hoje em dia seja mais fácil nos manter próximos a um número incrivelmente elástico de pessoas, talvez o afastamento permaneça inevitável. Por isso mesmo, é tão merecedor de destaque quando vivenciamos ou, no mínimo, ficamos sabendo, de uma história em que há prevalência da amizade acima de qualquer dificuldade que surgir no meio do caminho.

Com Gilles de Maistre à frente da direção, a narrativa de “A Menina e o Leão” (Mia et le Lion Blanc), como o próprio título indica, tem como centro a dupla formada por Mia Owen (Daniah De Villiers) e Charlie – ela, uma garota de 11 anos que se vê obrigada a abandonar sua rotina, escola e amigos em Londres, quando a família decide mudar para a África do Sul; ele, um filhote raro de leão branco, que promete ser a grande atração da fazenda onde a menina vai morar.

Se inicialmente havia certa e compreensível distância entre eles, com o passar do tempo, tornam-se inseparáveis. Com a opção do diretor em realizar o longa durante o período de três anos, para acompanhar o crescimento real da jovem e do leãozinho, ficam ainda mais críveis em tela todas as mudanças – físicas e emocionais – pelas quais tiveram que passar até que um laço de união se estabelecesse entre eles.

A história parece simples (e é até bom que seja assim), mas há um ponto em que a fofura e companheirismo dos improváveis amigos dá lugar a um assunto bem mais sério e sombrio: a caça a animais selvagens. Ainda que seja legalizada na África e até mesmo faça parte de suas tradições mais antigas, é algo muito difícil de se enxergar com bons olhos.

Espécies são criadas em fazendas (entendam-se cativeiros) e vendidas a milionários – turistas ou não – para serem abatidas e tornarem-se meros objetos de decoração ou apenas uma imagem em uma selfie (isso é mostrado de forma bem explícita – e para mim, surpreendente – na produção).

É para livrar Charlie de um destino cruel do tipo, que Mia decide encarar uma penosa jornada a fim de levá-lo a um Santuário cujos limites do terreno são protegidos por lei e onde animais não podem ser feridos. No caso do leão branco, também há uma profecia que afirma que seu retorno trará paz e felicidade a todos (o que chega a parecer injusto imaginar que pessoas inescrupulosas também terão sua parcela de alegrias em algum momento, segundo a previsão).

Ainda há espaço para uma inesperada reviravolta que colocará em xeque as atitudes e o caráter de um dos personagens, o que, mais uma vez, faz o espectador mais centrado se questionar sobre a boa e velha frase que prega que o homem é o único animal racional da natureza.

Com ares de filme para crianças, “A Menina e o Leão” surpreende pela forma como trata de assuntos sérios como o relacionamento entre pais e filhos, problemas emocionais causados por traumas na infância, segredos que podem acabar com convívios pacíficos e a sempre marcante passagem da infância para a vida adulta, com todos os altos e baixos que essa época nos traz.

Opção interessante para quem já tem algum histórico prévio de predileção por títulos que envolvam a participação de animais e para os que sabem o quão importante é ter consciência de sua existência no mundo em que vivemos, quer simpatizemos com eles ou não.

por Angela Debellis

Filed in: Cinema

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