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Crítica: “Confinado”

Talvez uma das maiores vantagens ao se criar uma obra totalmente ficcional seja a ausência de amarras, afinal, não existe a obrigação de ser fiel a uma história real. Mas, há algumas coisas tão absurdas na realidade, que fatos verídicos podem render histórias tão ou mais impensáveis.

Assim é a trama de “Confinado” (Locked) que, antes de ganhar essa versão norte-americana, já tinha sido tema de outras duas produções: a produção mexicana “4×4” (em 2019) e a brasileira “A Jaula” (2022). O que chama a atenção é que os eventos representados em tela – ou algo bem próximo a isso – aconteceram de verdade, na cidade argentina de Córdoba, em 2017.

No longa dirigido por David Yarovesky, conhecemos Eddie Barrish (Bill Skarsgård). Separado de sua companheira Amy (Gabrielle Walsh), ele tem poucas chances de estar perto de sua filha única, Sarah (Ashley Cartwright). Querendo provar que, apesar de todos seus defeitos, pode ser um pai responsável, mantém um trabalho de entregas feito com uma van.

Quando o automóvel precisa de conserto, o protagonista se vê diante de um dilema moral: para conseguir o dinheiro imediatamente, a única (e bem questionável) opção que lhe ocorre é recorrer ao roubo de algum carro – ou pelo menos de objetos que encontrar em seu interior. Ao encontrar um impressionante SUV de luxo (que tem o sugestivo nome de “Dolus”) com as portas destravadas em um estacionamento público, Eddie acredita ter tirado a sorte grande. O que ele não contava é ter estar diante do que se transformaria em seu próprio cativeiro.

Da maneira mais dolorosa possível, ele descobrirá que o proprietário é William (Anthony Hopkins), um renomado médico galês com dinheiro (e tempo) o bastante para ter criado um projeto que transforma o veículo em uma armadilha mortal. Entre choques elétricos, alterações drásticas de temperatura, privação de água / comida e músicas tocadas repetidamente em volume excessivo, Eddie terá que encarar a possibilidade de perder a vida graças a uma escolha equivocada.

Contudo, se o filme produzido por Sam Reimi dá a impressão de ser apenas uma vitrine para exibição de variadas torturas físicas e psicológicas, logo se transforma em algo mais profundo. O roteiro de Michael Arlen Ross coloca na mesa um assunto que nunca perde a relevância, capaz de gerar calorosos debates: a desigualdade social gritante que assola o mundo.

De um lado, um indivíduo jovem que vive com dificuldades financeiras, em uma área pouco convidativa e repleta de problemas. Do outro, um homem idoso, com uma carreira profissional que lhe rendeu uma vida confortável, mas que perdeu a filha para a criminalidade, após um assalto.

O que parece justo aos olhos de um é proporcionalmente injusto ao outro. Os argumentos para determinadas ações que se mostram válidos em um primeiro momento, perdem força quando olhamos o quadro com mais atenção, analisando não somente os detalhes que beneficiam tão só quem os apresenta.

Passado quase por completo dentro do referido carro, “Confinado” provoca aflição na medida certa. A fotografia de Michael Dallatorre faz questão de lembrar o espectador do quão reduzido é o espaço, seja com um passeio da câmera pelo estacionamento vazio, ou quando transita pelas ruas e becos que servem de tanto de abrigo a quem não tem recursos, quanto de palco àqueles cuja realidade está à margem da lei.

Bill Skarsgård é uma presença solitária na maior parte dos 95 minutos de duração do thriller / suspense. A voz de Anthony Hopkins (ouvida através do painel do SVU) impõe medo e respeito, assim como sua figura quando o ator entra em cena. A competente dupla de atores aumenta – e muito – a qualidade do que se vê em tela.

Vale conferir.

por Angela Debellis

*Título assistido em Cabine de Imprensa promovida pela Diamond Films.

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