O quanto conhecemos dos bastidores das produções coreanas que bombam no mundo ou do contexto histórico por trás delas?
“Na Teia da Aranha” (Cobweb) é uma comédia de 2023 que se passa na Coreia do Sul dos anos 1970. O protagonista é o diretor de cinema Kim (Song Kang-Ho), que deseja criar uma grande obra, mas enfrenta dificuldades com a equipe, com a censura da época e com a própria em surtos alucinatórios.
Kim é um diretor famoso, mas que vive na sombra de seu antecessor, fazendo dramas sensuais, sem nada de grande impacto. Após terminar de gravar seu último trabalho, “Na Teia da Aranha”, tem sonhos de como poderia ser muito melhor, então resolve gravar cenas extras para isso.
Porém, existe um grave problema: na prática, ele quer regravar o longa inteiro em apenas dois dias, mudando drasticamente a história. Um drama de sacrifício pela família transformado em uma narrativa de terror sobre vingança!
Primeiramente, assim como o Brasil, a Coreia do Sul enfrentou uma forte ditadura militar financiada pelos Estados Unidos até o final dos anos 1990. E, tal qual aqui, as produções tinham que ser autorizadas por uma equipe de censura que bloqueava qualquer coisa que pudesse ser vista como crítica ao governo ou aos costumes do país. Assim, as mais diversas “gambiarras” são feitas, a fim de manipular os censores para permitirem a mudança de roteiro.
A seguir, vem os problemas com a equipe. O staff que não sabe como filmar as sequências megalomaníacas na nova versão. Os atores têm minutos para decorar as falas e entender personagens cujas personalidades o diretor mudou radicalmente.
E o próprio diretor, querendo fazer as cenas grandiosas, não faz ideia do que elas realmente querem transmitir para conseguir coordenar a produção. Essa confusão toda tem um clima de humor acentuado pelo exagero dramático leve, ao mesmo tempo em que dialoga com situações reais do cinema atual.
É comum após exibições testes regravar algumas cenas para torná-las mais interessantes ou mesmo criar novas, visando que a trama fique mais clara ou para deixar o tom geral mais coerente com a proposta principal. As mudanças podem ser tantas a ponto de descaracterizar a película, além de levar à exaustão toda a equipe.
Essas alterações são feitas unicamente para tornar o produto mais vendável, sendo frequente grandes títulos ganharem “versões do diretor”, com o já ocorreu “Blade Runner”, “Superman” e “O Exorcista’, entre outros. Um dos casos mais extremos é o de “Liga da Justiça”, o qual foi totalmente refilmado (dobrando os custos) no meio da produção, com o diretor inicial só podendo completar as filmagens de sua versão original anos depois, em uma situação bem peculiar.
E, mesmo assim, temos diretores que brigam até hoje para levarem ao mundo seu material original. Lembrando que isso não significa necessariamente que esse conteúdo seja melhor , apenas a manifestação mais próxima da visão artística original dele.
Só que um filme não é feito por uma pessoa só (normalmente). Atores, figurinistas, cameramen, editores, músicos, entre muitos outros – basta observar a vasta quantidade de categorias do Oscar e que está longe de abarcar tudo – se unem para o longa existir, cada um dando sua visão para aquela cena, aquele personagem, aquela história.
Cinema é algo coletivo e dizer que a visão do diretor tem que prevalecer, dependendo de como é feito, pode ser uma depreciação do restante da equipe, como o próprio filme mostra em uma crítica excelente para os excessos que podem ocorrer.
Para cinéfilos como um todo e fãs de obras coreanas, fica a dica de “Na Teia da Aranha”.
por Luiz Cecanecchia – especial para A Toupeira
*Título assistido em Cabine de Imprensa Virtual promovida pela Pandora Filmes.
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