Crítica: “Não! Não Olhe!”

Diferentemente do proposto em seus títulos originais, é inglória a tarefa de classificar os filmes de Jordan Peele através da simplicidade de uma única palavra. No caso de “Não! Não Olhe!” (Nope), “Espetáculo” cumpre bem esse papel (o que já fica claro desde a primeira cena).

De maneira primorosa – como já se tonou sua marca registrada, Peele assume as rédeas e dirige, roteiriza e produz o longa de ficção científica / terror e faz com que o espectador mantenha os olhos fixos na tela, em busca de respostas que ora parecem óbvias, ora tornam-se obscuras.

A trama se passa quase em sua totalidade em um rancho na cidade de Agua Dulce, no interior da Califórnia, de propriedade da família Haywood, que, há gerações, é especialista em adestrar cavalos para participações nas mais diversas filmagens para a indústria do entretenimento.

O cotidiano pacato do local, que envolve o árduo treinamento dos animais, é interrompido com a morte inesperada do patriarca, Otis Haywood (Keith David), após um acidente envolvendo a queda de destroços de uma nave.

A liderança dos negócios passa às mãos do recluso OJ (Daniel Kaluuya), cuja falta de habilidade em lidar com os contratantes torna-se um problema para a manutenção do rancho. Em contrapartida, sua irmã Emerald (Keke Palmer) mostra-se muito mais habilidosa para enfrentar os nem sempre visíveis obstáculos presentes no caminho de um mercado que espera / obriga que todos tenham desenvoltura para encarar.

Problemas financeiros fazem com que OJ precise se desfazer de alguns de seus cavalos. É aí que entra uma das figuras mais interessantes (incômodas?) do longa: Rick “Jupe” Park (Steven Yeun), ex-estrela mirim televisiva, que cresceu sob os holofotes e teve transmitido, ao vivo, um grande trauma de infância, envolvendo sua participação em uma sitcom dos anos de 1990, que tinha como destaque um chipanzé adestrado.

Dono de uma espécie de parque de diversões, cujo tema é ele próprio, Jupe parece o comprador ideal para os animais. Mas, por trás do personagem com ares de cowboy, existe alguém que faz da vasta experiência em frente às câmeras, seu principal artifício para manter-se em evidência (não importando as consequências de seus atos) – cortesia da lavagem cerebral executada em prol do bom e velho “Espetáculo”.

À primeira vista, o roteiro de “Não! Não Olhe!” pode parecer relativamente simples, com a apresentação de problemas que não são tão improváveis. Mas, quando o público se sente mais seguro, é que as coisas começam a acontecer de fato, afinal, lidar com seres humanos não é fácil, mas lidar com criaturas desconhecidas pode ser ainda mais complicado.

Registrar a aparição do que supostamente seria uma nave espacial que paira há meses na região, torna-se o principal objetivo dos irmãos, que, para isso, contam com a ajuda do técnico em informática Angel Torres (Brandon Perea) e do cineasta cult Antlers Holst (Michael Wincott). Cada qual do seu jeito, será uma peça fundamental para o desenrolar da história e para a crescente do que é mostrado.

Dividido em capítulos (cujos títulos reforçam a importância dos animais), o filme tem um ritmo exemplar. A condução da narrativa se faz de modo a sempre incitar o espectador a querer mais informações, a torcer pelo êxito (da maioria) dos personagens. Tudo sob edição de som e trilha sonora que devem, facilmente, ser lembradas na próxima temporada de premiações, além da execução de uma das melhores sequências de terror que eu (sendo ávida consumidora do gênero) já vi, e que merece ser apreciada na maior tela possível.

Imperdível.

por Angela Debellis

 

*Título assistido em Cabine de Imprensa promovida pela Universal Pictures.

Filed in: Cinema

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