A dança é o principal foco das apresentações do Complexo Theatro Municipal no mês de setembro. E as razões não poderiam ser melhores: o brasileiro Alejandro Ahmed, conhecido por seu trabalho à frente da Cena 11 Cia. de Dança, apresenta uma coreografia que desafia espectadores – e bailarinos – ao interpretarem a música Sixty-Eight, de John Cage, enquanto o inglês Ihsan Rustem traz um trabalho cheio de mistério e poesia para a bela sinfonia Inacabada, de Schubert. Duas obras separadas em pelo menos um século desde que foram executadas pela primeira vez e que serão regidas pelo maestro Alessandro Sangiorgi.
“É uma alegria trazer a expertise e competência de coreógrafos como Alejandro Ahmed e Ihsan Rustem, com seus trabalhos consolidados tanto no que concerne às suas propostas artísticas, quanto às suas experiências”, diz Andrea Caruso Saturnino, diretora-geral do Complexo Theatro Municipal.
“Alejandro Ahmed tem um trabalho absolutamente marcante e estamos lisonjeados com esse intercâmbio com o Balé da Cidade”, afirma Cassi Abranches, diretora artística da companhia de dança do Theatro Municipal.
“No caso de IhsanRustem, desde ‘Deranged’, do austríaco Chris Haring, em 2018, o Balé não se unia a um coreógrafo internacional. Ihsan, que também atuou como bailarino em algumas das maiores companhias do mundo, conhecia o trabalho do Balé da Cidade e ficou feliz com o convite para coreografar a Inacabada, que será a sua segunda coreografia na América Latina”, completa Cassi Abranches.
O maestro responsável pela regência da Orquestra Sinfônica Municipal, Alessandro Sangiorgi, reforça como são especiais as escolhas musicais do programa: “É sempre um privilégio e uma alegria reger a ‘Inacabada’ de Schubert, uma das pérolas do repertório sinfônico”, afirma. Franz Schubert faleceu aos 31 anos e deixou essa sinfonia, como seu próprio nome assinala, sem conclusão. Sua primeira apresentação com uma orquestra aconteceu somente 43 anos depois de sua escrita e é a primeira criação em solo nacional assinada por Rustem.
Impermanência e mistério são alguns dos aspectos que povoam os intrincados e intrigantes movimentos dos 15 bailarinos em cena. A ideia tão humana do que não foi finalizado, do que não foi dito e até mesmo do que não permanece perpassa as diferentes situações apresentadas na coreografia, cuja criação contou com processos dos bailarinos explorando situações pessoais vividas relacionadas ao tema do inacabado e do impermanente, que remetem a finais e perdas. Na tônica da coreografia, movimentos exploram ao máximo a fisicalidade musical de Schubert.
“Eu gosto de ver a música nos dançarinos”, resume Rustem, que explora ainda a parceria intrincada e possibilidades teatrais em cena. Figurinos inspirados nos séculos XIX e XX se apresentam muitas vezes incompletos, numa leitura contemporânea dos trajes de época assinados por Cassiano Grandi. A iluminação fica a cargo de Caetano Vilela.
Já Sixty-Eight é uma obra musical escrita por John Cage no início da década de 1990, uma obra sem uma proposição inicial explícita de ser trazida ao universo da dança. O maestro Sangiorgi explica: “É uma obra na qual a indeterminação é a palavra-chave. Trata-se de uma sequência de 15 notas, cada uma delas durando entre zero e dois minutos. E essas notas, qualquer que seja o músico designado a tocar, têm uma variação de quando começam e quando terminam, contanto que se obedeça a orientação de tempo desejada pela partitura. Ou seja: temos notas com texturas diferentes provocando alguma harmonia, já que a cronometragem as encavala umas com as outras. Numa obra como essa, juntar música e dança dá uma dimensão muito diferente e especial”.
Ahmed complementa: “É uma coreografia que se auto-organiza através de um consenso de restrições que a gente estabelece e que faz com que as possibilidades não sejam simplesmente pré-determinadas pela autoridade do coreógrafo”, explica Ahmed, que trabalha pela primeira vez com a companhia de dança do Theatro Municipal. “Ela aborda o atravessamento das liberdades de escolha vinculadas a um consenso coreográfico comum que a gente estabeleceu, suscitando reflexões sobre a coletividade. É como um objeto que você reconhece o que é, mas está sempre em transformação”, afirma.
No trabalho coreográfico, 12 bailarinos em cena se distribuem em rampas, executando livremente uma partitura ou jogo matemático de regras a partir de um metrônomo-luminoso criado pelo artista Diego de Los Campos. Esse metrônomo, que cria compassos de entradas e saídas dos bailarinos em cena, está programado de acordo com um sistema digital. Dessa forma, há certa randomicidade, que resulta numa obra artística única a cada dia, e reflete sobre os conceitos de autonomia e coletividade.
Os figurinos são assinados por Karin Serafin com a assistência de Juliana Laurindo. Por vezes com o uso de máscaras, por vezes com a ausência total de qualquer adereço, são apresentadas possibilidades de extensão tecnológica e biocultural da roupa – adereço que protege, mas, também, transforma a percepção do movimento. A iluminação é de Mirela Brandi.
Serviço:
Balé da Cidade de São Paulo – Orquestra Sinfônica Municipal
02/09 (20h), 03/09, 04/09 e 07/09 (17h), 08/09 e 09/09 (20h) e 10/09 e 11/09 (17h)
Theatro Municipal – Sala de Espetáculo
Praça Ramos de Azevedo, s/n – República, São Paulo – SP
Capacidade: 1503 lugares
Classificação: 18 anos
Duração: aproximadamente 60 minutos
Ingressos: R$ 10,00 a R$ 80,00
da Redação A Toupeira