“Cada um de nós leva dentro de si, como em um pequeno cemitério, aqueles que têm amado”. Com essa frase de Romain Rolland, inicia-se o filme “La Cama”. A primeira cena mostra em forma prolongada (cerca de 10 minutos) e com bastante detalhismo, uma relação sexual frustrada de um casal – ambos parecem ter aproximadamente 60 anos, embora não se possa falar de velhice, têm algumas limitações e moléstias próprias deste período da vida. Principalmente é na cama onde, além do mencionado, aparecem mais evidências de desentendimentos, tanto físicos como emocionais. O matrimônio tem afundado.
Dessa separação se ocupa o relato que faz em forma pormenorizada, sem fugir de mostrar os corpos nus dos dois, obviamente em forma nada pornográfica. Também se ocupa das oscilações emocionais que, em geral, trazem desavenças e alguns momentos de carinho, nostalgia e até reencontros. Mas a tendência geral é a de uma separação com dor, tristeza e algo de mágoa. O longa procura ser misericordioso, mas há uma carga amarga e os dissabores prevalecem ao longo da exibição.
Resulta monótono ao reiterar esse fracasso ou, melhor, esse final de um longo caminho percorrido pelos protagonistas durante quase toda uma vida. Porém, pode interessar a parcelas de público como adultos em situações de crise ou preocupados com o que em geral seria o início da velhice.
Há um trabalho que exige muito dos dois únicos atores em cena: Alejo Mango (como Jorge) e Sandra Sandrini (Mabel), com as mencionadas cenas de nus e sexo e, também, primeiros planos dos rostos. Ambos têm poucos antecedentes diante do público de massa – a atriz é filha de Luis Sandrini e Malvina Pastorino, que foram atores muito famosos na Argentina. Mas a tarefa de Mango e Sandra aqui é árdua.
Esta realização representa um trunfo em particular de Mónica Lairana, diretora, roteirista e produtora, que trabalhou durante cinco anos para concretizá-lo. Trata-se de uma produção independente – com quatro contribuições de diferentes países -, de baixo orçamento e que não contou com grandes selos cinematográficos para sua realização. Claro que teve o apoio do Instituto Nacional de Cine y Artes Audiovisuales da Argentina e da Agência Nacional do Cinema e, também, da Berlinale (organização de cinema que organiza o festival de Berlim, na Alemanha).
“La Cama” também tem um tom geral próprio de uma obra de teatro. Isso deriva dos antecedentes que a diretora possui: formada na Escuela de Teatro de Buenos Aires e atriz de diversos títulos antes de dedicar-se a este, seu primeiro filme. É uma obra diferente, pois estamos acostumados a ver corpos mais jovens, principalmente nas relações de amor e sexo, e aqui são adultos com características próprias do passo do tempo. Também é intimista porque está focada nos sentimentos que aparecem nos vínculos humanos. Além disso, resulta triste porque mostra o final de uma longa relação de um amor já esgotado.
por Tomás Allen – especial para A Toupeira