Seja pelo avanço na tecnologia – que proporciona resultados cada vez mais convincentes de efeitos visuais, ou por um gosto coletivo que parece ter se firmado e que não tende a abandonar o alto posto, é possível dizer que a base do cinema atual são os títulos com ação ininterrupta – muitas vezes marcados por excessos – que faturam milhões em bilheteria em um piscar de olhos.
Mas, o que seria da sétima arte se não fosse sua capacidade de atender aos mais diferentes públicos? Para quem procura um pouco de leveza e uma história que será responsável por sorrisos do início ao fim, a grande pedida – e uma das melhores surpresas de 2022 – é “Sra. Harris vai a Paris” (Mrs. Harris goes to Paris).
Baseado no livro homônimo de Paul Gallico (que faz parte da série literária “The Adventures of Mrs. Harris”), o roteiro adaptado por Carroll Catwright, Keith Thompson, Olivia Hetreed e Anthony Fabian – este, também à frente da direção – se passa em 1957 e gira em torno da gentil figura de Ada Harris (Lesley Manville), viúva de um combatente da Segunda Guerra, que trabalha como faxineira em Londres.
Durante mais um dia de afazeres, ela se depara com uma peça criada por um dos maiores nomes da Alta Costura mundial, Christian Dior (que, na vida real, viria a falecer no mesmo ano em que a história acontece). O vestido, mais nova aquisição da quase falida aristocrata Lady Dant (Anna Chancellor), provoca um inesperado encantamento em Ada, que toma uma irrevogável decisão: ter uma peça assinada pelo estilista.
Para atingir tal intento, muitos sacrifícios são feitos – em um cotidiano que já não é dos mais aprazíveis. Mas, com o apoio de seus melhores amigos, Violete Butterfield (Ellen Thomas) e Archie (Jason Isaacs), e uma pitada de sorte, torna-se mais fácil acreditar na realização do sonho salpicado de lantejoulas e glamour.
Acompanhar a jornada da personagem pela capital francesa é um deleite. Por um lado, a viagem será marcada pela aparição de pessoas que muito têm a acrescentar, como a jovem modelo Natasha (Alba Baptista) e o contador André Fauvel (Lucas Bravo).
Em contrapartida, existe a crueldade daqueles que cruzam seu caminho e procuram diminuir sua importância como ser humano – grupo encabeçado pela diretora-executiva Madame Claudine Colbert (Isabelle Huppert) e pela arrogante Madame Avallon (Guilaine Londez), uma das maiores clientes da Maison Dior.
Por ingenuidade ou por seu coração bondoso, a protagonista não se deixa abater e, em umas das melhores sequências, vista em partes no trailer oficial, seu status social serve apenas para aumentar seu encanto ao acompanhar um desfile exclusivo da marca, destinado às figuras “relevantes” da sociedade – como o enigmático Marquês de Chassagne (Lambert Wilson) -, mas que, como tantos que conhecemos, já perderam há tempos a capacidade de se maravilhar com o que lhes é oferecido.
Com a afeição imediata do público, é simples pegar-se torcendo por Ada. Seja diante da possibilidade de concretizar um sonho, encontrar um novo amor, ou graças à sua habilidade nata de transformar as vidas de quem a rodeia (mesmo que, às vezes, isso lhe traga algum ônus). O desenrolar da narrativa traz um bem-vindo conforto ao coração.
Uma palavra muito usada pela personagem durante os 115 minutos de duração de “Sra. Harris vai a Paris”, pode resumir a obra: Adorável.
por Angela Debellis
*Título assistido em Cabine de Imprensa promovida pela Universal Pictures.