Crítica: “A Vida Invisível”

O que mais encanta em “A Vida Invisível” é que o filme não tem o propósito base de ser uma crítica social, não há discursos ou diálogos que reforcem isso, mas fica impossível assistir ao longa e não observar e refletir sobre o machismo existente na nossa sociedade – que é tão enraizado, e mesmo hoje, com tantas lutas vencidas, ainda vemos o reflexo deste comportamento influenciar diretamente nossas vidas.

A obra dirigida por Karim Aïnouz é um adaptação do livro de “A Vida Invisível de Eurídice Gusmão” de Martha Batalha e se passa no Rio de Janeiro dos anos 1940. Eurídice (Carol Duarte) é uma jovem introvertida e talentosa que sonha estudar piano em um reformatório fora do Brasil. Guida (Julia Stockler) é sua irmã mais velha, e o oposto de seu temperamento: a garota gosta da agitação e está apaixonada por um marinheiro grego.

Ambas vivem sob a rigidez imposta pelo pai, algo que era comum – e ainda é – em uma sociedade patriarcal. Guida decide fugir e parte em uma navio com o namorado, enquanto Eurídice se esforça para se tornar uma musicista, ao mesmo tempo em que concilia um casamento sem amor com Antenor (Gregório Duvivier).

A produção trata de assuntos fortes e delicados que nos anos 1940 eram tabus ou inimagináveis, e que hoje, apesar de serem discutidos, ainda são alvos de discriminações – por mais que nos pareça uma realidade distante. Guida se torna mãe solteira e sofre pressão externa, apesar de conseguir construir uma família ao lado de Filomena. Eurídice não quer ter um bebê, mas tem que continuar uma gestação “indesejada”, pois o aborto não é uma opção.

Há uma questão que pode gerar um pouco de desconforto: o longa é sobre o amor de duas irmãs e a busca incansável de uma pela outro durante toda a vida. Contudo, o relacionamento delas enquanto estiveram unidas não é bem desenvolvido, há pouquíssimas cenas de Carol e Julia juntas.

Fernanda Montenegro aparece nos minutos finais e é como se fosse a cereja do bolo: com atuação impecável, a veterana transmite emoção de maneiras inimagináveis, aliás todo o elenco é forte. Ver Gregório Duvivier em um papel que contradiz em tudo sua própria essência foi impressionante – ele dá vida a um homem machista, inseguro e opressor de tal forma que fica impossível não detestar Antenor.

Esse um drama daqueles que fala com toda uma sociedade, mas principalmente com mulheres que de alguma forma se sentirão representadas em algum momento. Como definiu Karim, durante a Coletiva de Imprensa realizada com a mídia em São Paulo: “Um folhetim de rasgar o coração”. Vale a pena prestigiar.

por Carla Mendes – especial para A Toupeira

Filed in: Cinema

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