Crítica: “Legalize Já – Amizade nunca morre”

Dizem que uma amizade pode mudar completamente o rumo de uma vida. Um era vendedor ambulante de camisetas de bandas; o outro fazia mix tapes piratas para diversos públicos, de igrejas evangélicas a bordéis.

Eles se conheceram graças a uma trombada entre os dois numa batida policial, que tomou as mercadorias de Marcelo, e por sorte o caderno de poesia deste ficou em posse de Skunk na confusão. Ao ler os escritos, Skunk propõe a Marcelo criar um grupo de rap, que mais tarde se tornaria um dos mais importantes na história do Brasil, o Planet Hemp.

“Legalize Já – Amizade Nunca Morre” é justamente o retrato desta amizade, e da fundação da banda. Dirigido por Gustavo Bonafé, Johnny Araújo – que trabalhou com o próprio Marcelo D2 em alguns de seus clipes – e estrelado por Ícaro Silva como Skunk, Renato Góes como D2, e Marina Provenzzano como a namorada e mãe do filho de D2, Sônia.

O primeiro aspecto notável do filme está em suas atuações: Ícaro Silva transmite bem as agruras passadas por Skunk, conforme este definha devido à AIDS, além de dar um tom rebelde e muita personalidade, a um personagem pouco registrado. Renato Goés, faz de maneira interessante um Marcelo antes de D2, hesitante em seguir a carreira artística, traduzindo os dilemas entre assumir sua responsabilidade vindoura de pai, e a conciliação com sua carreira artística. Vale destacar o fato de que os protagonistas cantaram as músicas apresentadas no longa, de maneira que não houve dublagem de gravações de D2.

Já Marina Provenzzano consegue trazer às telas a dificuldades de uma jovem com uma gravidez não desejada, complicando seus planos para o futuro, e os sentimentos ambíguos em relação a este fato.

O roteiro também é um ponto alto. Além de uma história interessante, o roteiro é bem amarrado, retratando com eficiência o começo de carreira de jovens artistas, o processo de criação de uma música, e a importância na amizade para a vida de ambos os jovens cantores.

Também deve-se dizer que há cautela em apresentar alguns temas. Em várias partes, os dois cantores declaram que sua música não é só sobre a legalização da maconha, mas de clamar por mais liberdade, e por menos opressão. A trama também usa motivos políticos não como forma de protesto, mas como contexto, para entender o raciocínio da dupla, que vivia em tempos complicados política e economicamente.

A parte técnica está bem-feita. A trilha sonora composta para o filme é de boa qualidade, e a escolha das músicas não-incidentais reforça o período e realidade vividos. A fotografia é boa e o uso de um filtro cinzento – contrastante com as cores vivas das telas de televisões em cena – é interessante e evoca uma sensação de passado. Porém esse mesmo filtro já foi desgastado de maneira inepta por outros cineastas, o que pode desagradar alguns.

“Legalize Já – Amizade Nunca Morre” é o retrato de uma jornada que criaria um dos maiores ícones do rap nacional, e merece a atenção tanto por fãs de rap, quanto por admiradores de música no geral, assim como por quem aprecia filmes bons.

por Ícaro Marques – especial para A Toupeira

Filed in: Cinema

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